Estados Depressivos

Um episódio depressivo pode ocorrer naturalmente na criança, na sequência de certos acontecimentos de vida, mais ou menos óbvios para o adulto, como uma perda real e de uma figura significativa (separação dos  pais, perda de algum familiar, por morte ou distânciamento...) ou algo que pode parecer menos propenso a criar sentimentos depressivos, como uma mudança de casa, separação de algum amiguinho, perda de um animal de estimação. Estes sentimentos depressivos podem ser mais concentrados ou dispersos ao longo do tempo, desencadeando alterações comportamentais na criança.

Estas alterações podem manifestar-se de várias formas. Por um lado pode ocorrer uma lentificação psicomotora, a criança move-se lentamente, pouco expressiva e sorridente, parecendo desinteressada pelo que a rodeia. Por outro lado, assiste-se ao inverso, a criança apresenta uma acentuada agitação psicomotora, não pára quieta, não conseguindo prestar atenção prolongada nas tarefas que lhe são propostas. Estes momentos de agitação podem alternar com momentos de inatividade quase total, na qual a criança fica quieta (por exemplo, frente à televisão), mas não parece, de facto, estar a pensar ou prestar atenção a nada.

Nos momentos de inquietude a criança é tomada por acessos de cólera, fica agressiva e entra facilmente em conflito.

Sentimentos de ataque à auto-estima são, também, manifestos em expressões como "sou um inútil", "não sou bom em nada", proferidos de forma continuada e repetitiva. Esta desvalorização é facilmente observada em situações de jogo ou da realização de trabalhos escolares, nas quais há uma tendência para dizer "não consigo", "não sei fazer isto". Em última análise, este sentimento de desvalorização alastra-se à relação familiar e social, já que a criança manifesta pensar que os pais ou amigos já não gostam dela. Estas são expressões significativas que refletem um sentimento de perda de amor, acompanhado por sentimentos de desvalorização e culpabilidade.

Ao sentir-se incapaz e com dificuldade em concentrar-se nas tarefas escolares, a criança tende a evitar as tarefas académicas, o que pode desencadear perturbações ao nível do rendimento escolar, mesmo quando ela se dedica várias horas a estudar, mas como não se consegue concentrar e memorizar o que estuda, não consegue obter resultados satisfatórios.

A nível da alimentação também tendem a ocorrer alterações, quer com o comportamento anorectico verificado em crianças pequenas, como de ingestão excessiva que ocorre em crianças maiores ou pré-adolescentes.

O sono não é fácil, com resistências ao deitar, até porque, sendo provavel a ocorrência de pesadelos, a criança receia o acto de adormecer e mergulhar no mundo dos sonhos. Estes pesadelos dão conta de uma ansiedade significativa, com a expressão de medos frequentes, nomeadamente o receio de que aconteça algo grave que envolva a perda dos pais.

Os comportamentos fóbicos também podem estar presentes, nomeadamente na fobia escolar, na qual a criança recusa sair de casa para ir à escola, reflectindo um receio de se afastar o seu lar familiar ou o receio do abandono que esse afastamento poderia acarretar.

Esta ansiedade pode, ainda, manifestar-se em perturbações psicossomáticas, como dores de cabeça ou de barriga. Em certas crianças podemos, ainda, assistir a enurese ou encoprese.

As interacções com os amiguinhos também podem sofrer efeitos negativos, uma vez que este abatimento e afastamento da criança perturba as brincadeiras, os jogos e interações sociais.

O adulto é altamente investido, de modo a que a sua presença se revela fundamental, a criança manifesta-se receosa do afastamento do adulto e procura agradar, de modo a que não ocorra o receado abandono. Muitas vezes, quando estas crianças são integradas em ambientes escolares encontram várias dificuldades, já que ainda não conseguem estabelecer devidamente relações com os pares, por ainda necessitarem da relação dual com a mãe ou outro adulto significativo.

Não é infrequente assistir a inúmeros "disparates", como se a criança "provocasse" o adulto para que este a sancionasse por uma culpa imaginária e intensa que a invade.

Dado que a evolução destes sintomas pode desencadear várias perturbações comportamentais e dificuldades a nível da socialização torna-se de vital importância o encaminhamento para uma intervenção psicoterapêutica.